Escolha uma Página

Um recente parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) passou a permitir a exclusão do ICMS-ST (substituição tributária) da base de cálculo do PIS e da Cofins. Agora, a interpretação da Fazenda deverá ser seguida por toda a administração pública do país.

O documento reduz o risco de judicialização, pois respeita a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o tema e afasta o entendimento de três soluções de consulta da Receita Federal em sentido contrário.

No regime de substituição tributária, a cobrança do tributo de toda a cadeia produtiva é antecipada para o primeiro integrante dela – normalmente fabricantes ou importadores, os “substitutos tributários” – com o objetivo de facilitar a fiscalização do imposto. Os substituídos não recolhem o ICMS diretamente ao Estado.

Em 2023, por unanimidade, os ministros do STJ decidiram que o ICMS-ST não compõe a base de cálculo dos tributos federais devidos pelo contribuinte substituído. Isso porque o imposto estadual apenas transita pelo caixa das empresas e, assim, não configura faturamento (Tema 1125).

O tema é uma das teses filhotes da tese do século, em que o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a exclusão do ICMS da base das contribuições federais, em março de 2017 (Tema 69).

Existe recurso do contribuinte pendente de análise no STF neste caso do ICMS-ST. Mas a empresa já pediu a desistência. Ainda que fosse julgado, teria poucas chances de mudar o acórdão, pois a matéria é infraconstitucional, ou seja, a última palavra sobre o assunto é do STJ (ARE 1509158).

Por ter sido dada em recurso repetitivo, a decisão do STJ vale para todo o Judiciário, mas não obriga os auditores fiscais a cumprir. Tanto que, após o julgamento da Corte, foram editadas as soluções de consulta de nº 4046, 4047 e 4048 de 2024 da Divisão de Tributação (Disit) da Superintendência Regional da Receita Federal do Brasil 4ª Região Fiscal vedando a possibilidade da exclusão do ICMS-ST sobre o PIS e a Cofins para os substituídos.

O entendimento da Receita Federal, contrário ao do STJ, preocupou as empresas, mesmo não tendo caráter vinculante. Porém, afirmam especialistas, com o parecer da PGFN respeitando o que foi decidido pela Corte, a interpretação do Fisco é afastada.

No parecer, a PGFN cita o julgamento da tese do século, mas frisa que a opinião da Fazenda Nacional é que não se aplica à substituição tributária. Isso porque o substituto tributário, ao recolher o PIS/ Cofins, já o faz com a exclusão do ICMS-ST, como dispõe o Decreto-Lei nº 1.598/1977.

“Quanto ao revendedor, considerando que o ICMS foi recolhido na etapa anterior e que não há ICMS destacado na nota, a supressão do ICMS recolhido pelo substituto importaria aproveitamento em dobro”, disse a PGFN, no parecer SEI Nº 4090/2024, do dia 16 de dezembro.

Ela reconhece, contudo, que essa linha argumentativa ficou vencida no STJ e que o STF, em outra ação, definiu ser infraconstitucional controvérsias sobre a inclusão do ICMS destacado ou recolhido antecipadamente pelo substituto tributário na base do PIS/Cofins (Tema 1098).

Por conta disso, a PGFN se deu por vencida. “Não se verificando meios à superação do precedente do STJ e sendo a matéria infraconstitucional, propõe-se a inclusão do tema objeto da presente parecer na lista de dispensa de contestação e recursos desta Procuradoria-Geral”, afirma a procuradora Andreia Machado Cunha, que assina o documento.

Segundo o advogado Rafael Ristow, sócio do BCOR Advogados, esses pareceres têm como intuito evitar a litigiosidade excessiva. No escritório, ele disse ter pelo menos 10 casos em que a PGFN recorreu de decisões monocráticas do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo, mesmo após o julgamento em repetitivo do STJ. “A procuradoria só tem a prerrogativa de não recorrer depois do parecer”.

O documento, portanto, é importante porque a procuradoria “reconhece a derrota” e desiste dos recursos. Sem essa orientação havia o risco, por conta das soluções de consulta da Receita, de a decisão favorável aos contribuintes não ser cumprida. “Mesmo com o precedente, havia o risco de ter alguma autuação ou para quem fizesse a compensação administrativa, ela não fosse homologada”, diz Ristow.

Agora, os contribuintes podem ficar mais tranquilos, conclui. “Os próprios auditores, por lei, vão ter que reconhecer o direito à exclusão”, diz. “Eles ainda podem olhar a parte quantitativa, se os valores que estão sendo excluídos estão corretos, mas a parte jurídica, se tem o direito ou não à exclusão, agora já pacificou”, afirma, citando o artigo 19 da Lei nº 13.874/2019.

O tributarista Renan Godoy, sócio do Giordani Advogados Associados, que atuou em um dos casos julgados pelo STJ em conjunto com Guilherme Wagner, avalia o parecer da PGFN como positivo, mas alerta que é mais restritivo do que a decisão dos ministros. “A procuradoria fala que só o ICMS-ST destacado na nota é que pode ser retirado do cálculo do PIS e da Cofins. A gente discorda, porque muitos contribuintes que pagam o ICMS-ST diretamente, não por meio de destaque na nota, vão ser prejudicados”, diz o especialista.

De acordo com ele, há situações em que o ICMS-ST é recolhido pelo comprador da mercadoria e não pelo vendedor, de modo que os adquirentes terminam sendo substituídos e substitutos ao mesmo tempo. “O ICMS-ST não vem destacado na nota de compra e venda, ele é pago pelo contribuinte que recebe a mercadoria em uma guia apartada, exclusiva para essa operação. Então, nesses casos, embora se encaixe perfeitamente no mérito da causa, acaba ficando de fora, na opinião da procuradoria”, afirma Godoy.

Fonte: Valor Econômico