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A decisão do governo de determinar um aumento na cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) no país pode ser judicializada, na avaliação de advogados tributaristas ouvidos pelo Valor.

O Decreto 12.466, de 2025, que majorou o tributo, traz uma “controvérsia constitucional”, segundo Arthur Mendes Lobo, sócio do Wambier, Yamasaki, Bevervanço e Lobo Advogados.

O advogado explica que, diferentemente de outros impostos, o IOF pode ter suas alíquotas alteradas por decreto presidencial, sem passar pelo Congresso, mas pondera que isso não é um cheque em branco.

“A própria Constituição estabelece que o IOF deve ser usado como instrumento de política monetária e cambial. Seu propósito é regular o mercado, controlar o crédito, influenciar o câmbio e conter a inflação. Não é, ou não deveria ser, um simples mecanismo para elevar a arrecadação”, afirmou.

Para o advogado, ao aumentar o IOF com a única intenção de fazer caixa, o governo corre o risco de ferir princípios constitucionais como a legalidade tributária, a moralidade administrativa e o dever de proporcionalidade: “Se a finalidade do imposto está sendo distorcida, a medida pode ser considerada inconstitucional”, afirma.

Para Lígia Regini, sócia do BMA advogados, parece questionável aplicar a exceção à anterioridade (validade imediata do decreto) se a majoração tem declarado propósito arrecadatório, sem a extrafiscalidade típica deste tributo. “Esse ponto já foi questionado para mim por três clientes”, afirmou.

Segundo Regini, a exceção ao princípio da anterioridade (que prevê um ano para aplicação de mudança tributária) do IOF se baseia na hipótese de alteração de alíquota ou base de cálculo para atendimento a política monetária por isso não se aplicaria no caso do decreto voltado ao incremento da arrecadação.

A advogada lembra que, historicamente, decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) em situações similares negaram o pedido. Com a revogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) houve majoração do IOF e alguns pedidos em 2015 foram negados porque o STF entendeu que não estava comprovada qual a finalidade real da majoração do IOF.

“Nessa situação é declarado pelo governo federal que o IOF está sendo majorado para arrecadar mais e fazer frente ao equilíbrio do orçamento”, afirmou. A advogada destaca que o IOF pode ser majorado, mas respeitando o prazo de um ano.

Para Pedro Siqueira, sócio do Bichara Advogados, há chance de judicialização por causa da função arrecadatória. “Nessa função deveria seguir as normas de legalidade, só aumentar tributo por lei, e observar anterioridade e noventena”, afirmou.

Ainda segundo Siqueira, para o IOF câmbio há mais um ponto. O decreto antigo previa que o IOF câmbio teria a alíquota zerada até 2029, o abandono dessa previsão fere a segurança jurídica.

“Nesse caso (do decreto 12.466) a função passou um pouco da regulatória para ser mais arrecadatória”, afirmou a advogada tributarista Vanessa Cardoso, consultora de Keramidas Advogados. Mas, para a advogada o desvio de finalidade do tributo não seria uma razão forte para judicializar.

A advogada destaca as operações sobre o “risco sacado”, a antecipação de crédito com cessão de recebíveis e aval do sacado. “O decreto passou a qualificar a antecipação de recebíveis por meio do ‘risco sacado’ como operação de crédito sujeita ao IOF. Aqui poderia ser caracterizado como uma nova operação de crédito que não existia”, afirmou.

A discussão é se seria de fato uma operação de crédito, pela característica dessa prática. “Aqui é uma antecipação de créditos, não é efetivamente um crédito novo”, afirmou.

Procurada para comentar a possibilidade de judicializações, a Fazenda não retornou até fechamento desta reportagem.

Fonte: Valor Econômico