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O Ministério da Fazenda negocia com os maiores bancos do país os primeiros acordos no âmbito do Programa de Transação Integral (PTI), uma das principais apostas do ministro Fernando Haddad para atingir a meta de déficit zero este ano. Há otimismo na equipe econômica em relação às negociações com as instituições financeiras. Nos bastidores, é esperado que um primeiro banco firme em breve a primeira transação no âmbito do programa.

Até o momento, dois de três editais no âmbito do PTI, publicados pela Receita Federal e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), contam com o interesse direto tanto dos grandes bancos como de outras empresas de outros setores econômicos.

Com o programa, desenvolvido a pedido das grandes companhias, a Fazenda quer encerrar litígios tributários bilionários que se arrastam há décadas com os maiores contribuintes do país. A intenção da pasta é arrecadar quase R$ 42 bilhões este ano com o PTI ao somar tanto as teses quanto a recuperação de créditos inscritos em dívida ativa com cobrança judicializada, conforme mostrou o Valor.

O PTI é uma inovação na negociação tributária entre a Fazenda e contribuintes. Isso porque, até ano passado, somente companhias com baixa capacidade de pagamento poderiam fechar acordos e encerrar disputas tributárias. Agora, até mesmo bons pagadores podem negociar com a equipe econômica e colocar fim aos processos.

Somadas, as teses disponíveis para negociação, incluindo os bancos e empresas de todos os setores, indicam para litígios tributários que somam quase R$ 130 bilhões, segundo números internos da pasta.

Mas, para alcançar a arrecadação prevista de R$ 42 bilhões, a Fazenda conta também com a negociação referente a outras teses tributárias, que serão publicadas ao longo de 2025. Há uma expectativa de discussão de 17 temas ao longo do ano. Os descontos podem chegar a até 65% do valor devido.

Em um dos editais publicados que conta com o interesse do setor financeiro, discute-se a dedução do ágio fiscal gerado em reestruturação societária dentro do próprio grupo econômico, conflito que leva a diversos litígios bilionários tanto no Judiciário quanto no âmbito administrativo, no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão recursal da Receita Federal.

Outro edital em aberto é um pouco mais amplo, discutindo, primeiro, a incidência de contribuições previdenciárias e de contribuições destinadas a outras entidades ou fundos sobre valores pagos a título de participação nos lucros e resultados da empresa.

Esse mesmo edital também envolve a tese da incidência de Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF), de contribuição previdenciária e de contribuições destinadas a outras entidades ou fundos sobre os valores auferidos em virtude de planos de opção de compra de ações, os “stock options”.

Após uma primeira análise dos editais, publicados no início de janeiro, os bancos levaram alguns pleitos à Fazenda por meio das entidades de representação, como a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e a Confederação Nacional Financeira (CNF) como forma de ampliar o apetite para adesão.

Entre as regras publicadas, o contribuinte pode utilizar prejuízo fiscal e base negativa para pagar a dívida ao Fisco. Os bancos, apurou o Valor, querem um aumento deste limite, atualmente previsto em 20%. Mas há resistências nesse ponto no governo.

O segundo pleito das instituições financeiras é a realocação do depósito judicial de um contencioso que está contemplado no âmbito do PTI para um litígio que não é atingido pelo programa, diminuindo, assim, os custos para os bancos. Esse pedido já encontra perspectivas melhores na Fazenda.

O terceiro pleito é a ampliação do escopo dos editais já publicados, também de forma a tornar a adesão das instituições financeiras mais favorável, como houve no edital referente a discussões tributárias de ágio.

Na avaliação de Breno Vasconcelos, sócio do Mannrich e Vasconcelos Advogados e professor do Insper, o PTI “tem um grande potencial para reduzir o estoque de litígios tributários e trazer previsibilidade para o ambiente de negócios, mas seu sucesso dependerá das condições oferecidas”.

“A adesão a esses programas ainda depende de quão atrativas são as condições oferecidas. Embora os novos editais tragam melhorias, um fator que poderia aumentar o interesse do mercado seria a ampliação do limite para compensação de tributos com prejuízo fiscal e base negativa de CSLL”, considerou, ao concordar com um dos pleitos defendidos pelas instituições financeiras.

Em sentido semelhante avaliou Luciana Aguiar, sócia do Alma Law e especialista em direito tributário. Os editais, ela comentou, poderiam ser explícitos, como foi em outros aspectos, sobre a possibilidade de adesão parcial das teses.

“Há nuances que podem fazer muita diferença na decisão de adesão em função do prognóstico da causa, logo eliminar a dúvida poderia ser útil para maximizar a segurança jurídica do contribuinte”, falou a especialista.

Além dos dois editais que têm interesse direto das instituições financeiras, há um terceiro tema em discussão, que discute insumos produzidos na Zona Franca de Manaus e utilizados para produção de bebidas não alcoólicas, para fins de aproveitamento de créditos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

Procurado, o Ministério da Fazenda não se manifestou. A Febraban disse que o programa de transação integral “está aberto a qualquer contribuinte de todos os setores econômicos e a Febraban, em conjunto com a CNF, tem mantido uma agenda de discussão sobre os termos dos editais, buscando viabilizar condições que possam por fim a litígios tributários de longa data entre bancos o fisco”.

O presidente da CNF, Rodrigo Maia, afirmou que o “o compromisso é contribuir para a construção de uma agenda que reduza o contencioso, um dos problemas mais urgentes e graves do país hoje”. “Não apenas o nosso setor tem analisado o PTI, e estamos sugerindo aprimoramentos para garantir uma participação mais ampla do setor financeiro”, disse, em nota.

Fonte: Valor Econômico