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O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por maioria, que são cabíveis as ações rescisórias movidas pela União para anular os créditos da “tese do século”- a exclusão do ICMS da base do PIS e da Cofins. O julgamento foi finalizado na sexta-feira, no Plenário Virtual. Cerca de 1.100 ações rescisórias foram ajuizadas pela Fazenda Nacional sob o argumento de adequar decisões definitivas dos contribuintes que destoariam do precedente do STF.

O resultado foi um banho de água fria para as empresas, que tinham neste processo a esperança de reverter recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o mesmo tema. Em setembro, a 1ª Seção foi favorável à Fazenda Nacional.

Os ministros do STJ permitiram a admissão das rescisórias para adequar as sentenças favoráveis aos contribuintes que transitaram em julgado antes de maio de 2021, quando o STF restringiu os efeitos da tese do século (REsp 2066696 e REsp 2054759). A decisão levou em conta o artigo 535, parágrafo 8, do Código de Processo Civil (CPC).

O recente julgamento do STF basicamente valida esse resultado. A maioria seguiu o voto do presidente, o ministro Luís Roberto Barroso. Ele julgou tanto a repercussão geral da matéria quanto o mérito, pois entendeu ser caso de reafirmação da jurisprudência.

No voto, Barroso menciona uma jurisprudência “dominante” do STF sobre a possibilidade de rescisória para adequar à modulação de efeitos, citando precedentes unânimes das duas turmas (RE 1478035 e RE 1480488).

Na visão de Barroso, o julgamento dos embargos de declaração na tese do século, em maio de 2021, que restringiram os efeitos da decisão de mérito, tomada em março de 2017, fazem parte do precedente. “Não houve alteração de orientação, porque a primeira vez que o Plenário do STF se manifestou especificamente sobre o tema da modulação dos efeitos foi ao apreciar os embargos de declaração no RE 574.706 [Tema 69]”, afirmou.

Barroso foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cristiano Zanin, Dias Toffoli, André Mendonça e Cármen Lúcia. Divergiram os ministros Luiz Fux e Edson Fachin. Nunes Marques apenas manifestou entendimento favorável à repercussão geral da matéria (RE 1489562).

Para Fux, é preciso respeitar o sistema de precedentes, a coisa julgada e a segurança jurídica, resguardadas pela Constituição Federal. Na visão dele, quando foi formada a sentença favorável ao contribuinte sobre o a tese do século, entre o julgamento de mérito, em 2017, e o dos embargos, em 2021, ela “estava em perfeita harmonia com a jurisprudência vinculante do Supremo Tribunal Federal”.

“A coisa julgada material não pode automaticamente desaparecer diante da decisão do Supremo Tribunal Federal, sob pena de se estar atribuindo a esta decisão o poder de nulificar as decisões legitimamente tomadas pelos juízes e pelos tribunais”, completou, no voto, citando o Tema 136, em que foi vedada a ação rescisória nessas situações.

Na sustentação oral, o procurador da Fazenda Nacional Leonardo de Menezes Curty ressaltou que o caso é de “extrema relevância” para a União. Ressaltou que se ações rescisórias não fossem permitidas, o Judiciário autorizaria uma “soma considerável de valores que podem ou não ser repetidas ou compensadas pelos contribuintes em face dos cofres públicos.”

O caso em julgamento tratava de um contribuinte que entrou com ação pela exclusão do ICMS da base do PIS e da Cofins em outubro de 2017, tendo o trânsito em julgado (quando não cabe mais recurso) em fevereiro de 2019. Ele recorreu no STF após o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) admitir a rescisória da União contra essa decisão.

Para Curty, “é o caso de se rescindir a coisa julgada, de maneira a se preservar os primados da segurança jurídica, da isonomia, e mesmo da força normativa da própria Constituição”.

De acordo com o tributarista Gustavo Taparelli, sócio do Abe Advogados, não seria o caso de reafirmação de jurisprudência. “É um caso nunca julgado pelo STF, no sentido de se verificar se o trânsito em julgado dos processos que foram ajuizados depois de 2017, mas transitados antes da modulação de efeitos, iriam sofrer o efeito da ação rescisória ou ou não”, defende.

Segundo Douglas Guilherme Filho, coordenador da área tributária do Diamantino Advogados Associados, o recente julgamento seria a saída para os contribuintes preservarem decisões proferidas entre a decisão de mérito na tese do século e do recurso. “A decisão do Supremo chancela a decisão do STJ e acaba com qualquer saída do contribuinte que tem decisão transitada em julgado de 2017 a 2021. Não tem mais escapatória”, afirma.

Mas a discussão está longe de acabar. Isso porque ainda é preciso definir a partir de quando é possível entrar com a ação rescisória. De acordo com Guilherme Filho, a legislação prevê duas hipóteses: dois anos a partir da data do trânsito em julgado de cada contribuinte na ação individual, ou dois anos da data em que se reconheceu a repercussão geral sobre o tema.

Se o segundo critério for o adotado, abriria margem para que o julgamento desta semana seja o marco temporal para o ajuizamento dessas ações. Na prática, a Fazenda poderia buscar a anulação até outubro de 2026. “Seria uma insegurança jurídica enorme e uma discussão interminável, por algo que não representa tanto para a Fazenda.”

Essa briga deve ocorrer em eventuais embargos de declaração da decisão proferida na semana passada. Para tentar emplacar o primeiro critério como marco temporal (do trânsito em julgado da sentença favorável ao contribuinte), a ideia seria usar o precedente da quebra automática da coisa julgada. Em fevereiro do ano de 2023, o Supremo entendeu que decisões individuais favoráveis aos contribuintes se tornariam automaticamente inválidas quando a Corte julgasse o tema de forma contrária (Temas 881 e 885).

Fonte: Valor Econômico